Acontece em Lisboa
O Pão dos Anjos

A paleta quase monocromática impunha a sua presença na sala do capítulo do Convento da Graça que refulgia com os seus majestosos painéis de azulejo em azul e branco.

E tanta era a imponência do brilho dessa cor primária tão ligada a tranquilidade e harmonia que o rosa do chão entre-cortado com cinzentas linhas geométricas não passava de uma pálida mancha apagada.

Nos painéis as cenas convidavam a reflexão, e não escondiam o poder catequético das imagens através das quais a Ordem dos Agostinhos pretendia transmitir os seus valores aos seus irmãos que em silêncio as contemplavam.

O martírio era o tema mais comum,

-Regardez, les bandes sont des textes. – exclamava uma voz que se levantava do burburinho da sala.

A afirmação levou-o a verificar, palavras era verdade, e essas palavras estavam no que pareciam ser fitas ou seriam cordas? mas o que diriam?, nessa altura outras palavras chegaram aos seus ouvidos distraindo-o com outros vagos pensamentos mais contemporâneos. Era sempre assim não conseguia controlar a ordem ou velocidade com que se dispersava por outros temas. Não ia perder tempo a tentar entender o motivo, seguiu em frente, e mesmo a um canto encontrou uma cena de singela beleza.

Pães estavam a ser distribuídos por anjos, era o Pão dos Anjos. No recôndito da sua memória lembrou-se que algures tinha lido de Soror Mariana do Rosário, freira no sec XVII,  “Que nem os anjos, sendo tão puros por natureza e tantos por graça  podem dizer de si que são capazes daquele pão de vida que tem o nome de Pão dos Anjos”

O Pão dos Anjos é doce porque a caridade é doce e a Humanidade carente de conhecimento e elevação nas boas qualidades recebe esse Pão Doce como uma dádiva do Alto. Na imagem alguns elementos não tinham rosto definido porque seria?, destruição dos séculos talvez.

E absorto nesta irreal lição de beleza e altruísmo, saiu para o átrio da igreja e no bar bem ao lado do busto em bronze de Sophia degustou um Pão de Deus, esse sucedâneo do Pão do Anjos que a gastronomia adotou.

E nessa verdade facultada pelo silêncio da reflexão contemplou Lisboa a partir de um dos seus miradouros mais icónicos.

 

Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos
Pão dos Anjos