A paleta quase monocromática impunha a sua presença na sala do capítulo do Convento da Graça que refulgia com os seus majestosos painéis de azulejo em azul e branco.
E tanta era a imponência do brilho dessa cor primária tão ligada a tranquilidade e harmonia que o rosa do chão entre-cortado com cinzentas linhas geométricas não passava de uma pálida mancha apagada.
Nos painéis as cenas convidavam a reflexão, e não escondiam o poder catequético das imagens através das quais a Ordem dos Agostinhos pretendia transmitir os seus valores aos seus irmãos que em silêncio as contemplavam.
O martírio era o tema mais comum,

-Regardez, les bandes sont des textes. – exclamava uma voz que se levantava do burburinho da sala.

A afirmação levou-o a verificar, palavras era verdade, e essas palavras estavam no que pareciam ser fitas ou seriam cordas? mas o que diriam?, nessa altura outras palavras chegaram aos seus ouvidos distraindo-o com outros vagos pensamentos mais contemporâneos. Era sempre assim não conseguia controlar a ordem ou velocidade com que se dispersava por outros temas. Não ia perder tempo a tentar entender o motivo, seguiu em frente, e mesmo a um canto encontrou uma cena de singela beleza.
Pães estavam a ser distribuídos por anjos, era o Pão dos Anjos. No recôndito da sua memória lembrou-se que algures tinha lido de Soror Mariana do Rosário, freira no sec XVII,  “Que nem os anjos, sendo tão puros por natureza e tantos por graça  podem dizer de si que são capazes daquele pão de vida que tem o nome de Pão dos Anjos”
O Pão dos Anjos é doce porque a caridade é doce e a Humanidade carente de conhecimento e elevação nas boas qualidades recebe esse Pão Doce como uma dádiva do Alto. Na imagem alguns elementos não tinham rosto definido porque seria?, destruição dos séculos talvez.
E absorto nesta irreal lição de beleza e altruísmo, saiu para o átrio da igreja e no bar bem ao lado do busto em bronze de Sophia degustou um Pão de Deus, esse sucedâneo do Pão do Anjos que a gastronomia adotou.

E nessa verdade facultada pelo silêncio da reflexão contemplou Lisboa a partir de um dos seus miradouros mais icónicos.

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